25 de junho de 2009

Antônio Lobo Antunes

Sou uma mulher de silêncio que não aprecia as efusões nem as lágrimas. Falo pouco por a maior parte das palavras se me afigurarem vãs, e julgo que, para os outros, percorri a vida numa gravidade serena, na qual não puderam adivinhar tristeza ou desespero. Não me viram uma lágrima no dia em que meus pais ou o meu marido se foram, como raras gargalhadas me devem ter escutado nos setenta anos que duro. Uma mulher de silêncio morando no silêncio, a ouví-lo no interior dos sons, no interior das frases e da música, o silêncio das ondas na Ericeira, o silêncio dos ralos no Algarve, o silêncio das discussões quando os gritos começam e os muros urram, ecoando o despeito das pessoas.

A Ordem Natural das Coisas