30 de maio de 2008

Austregésilo Carrano


foto do Clayton, do jornal eletrônico Ponto de Fuga (http://www.pontodefuga.jor.br/)

Com pesar anuncio a morte de Austregésilo Carrano.

Nos conhecemos há quase um ano atrás na mesinha do bar do Espaço dos Parlapatões, Patifes e Paspalhões, no centro de São Paulo. Na semana seguinte estaria ele no Satyros Um, autografando seu livro. Depois, encontrei ele na Benedito Calixto, vendendo seu livro, O Canto dos Malditos, no espaço Plínio Marcos. Nesta mesma tarde, fomos assistir, no Espaço Cultural Alberico, o filme Brasil, de Rogério Sganzerla, seguido de uma conversa com a atriz e diretora de cinema e teatro Helena Ignez. Lembro de Austregésilo pedindo para eu dizer a ela que eu era atriz e que eu pegasse o contato dela para mandar meu material depois. Não fiz nada do que ele sugeriu. Sou assim mesmo, não me ligo em ficar me divulgando quando o assunto não tem nada a ver comigo. Sou chatona.

Mais à noite, encontrei ele, o pessoal da Poesia Maloqueirista e outros amigos. Fomos num barzinho e depois colamos na minha casa e bebemos os resquícios de bebidas alcoólicas que ainda nos restavam(um fim de vinho, um fim pinga, um fim de vodka). Esperamos mais um pessoal chegar e fomos rumo à uma festa na casa de um ator do Teatro Oficina. Alguns foram de carro e outros, caminhando. Entre os caminhantes estávamos nós, Austregésilo e eu, e fomos conversando até chegarmos a tão cobiçada festa. Uma noite muito agradável para todos nós, que nos conhecemos melhor e ainda colhíamos bons frutos desde então.

Um cara simples. Um cara que deixa saudade. Era muito bom poder encontrá-lo ali, tão pertinho da minha casa, na Benedito Calixto. Com certeza uma pena essa perda. Um transplante que não chegou a tempo. Muito triste mesmo. Uma fila para continuar vivendo. Triste demais. Talvez eu deixe de reclamar tanto das filas de contas a pagar.

Vai com Deus, querido.

Abaixo, um texto, sobre o Carrano, que “roubei” do blog de Flávio Jacobs e logo em seguida, um texto da wikipédia.

1957-2008 Morre autor que inspirou o filme Bicho de Sete Cabeças Morreu na noite de ontem em São Paulo o escritor e ativista curitibano Austregésilo Carrano Bueno. Carrano ficou conhecido pelo seu livro Canto dos Malditos, em que denuncia os maus tratos em hospitais psiquiátricos, narrando sua trajetória por diversos deles em Curitiba e Rio de Janeiro. O livro deu origem ao premiadíssimo filme Bicho de Sete Cabeças, de Lais Bodanzky, que alavancou a carreira de Rodrigo Santoro no cinema. Santoro viveu o personagem alter-ego de Carrano, e suas agruras nos hospícios. Nos últimos anos, Carrano destacou-se também como dramaturgo e ativista, na luta pela melhoria das condições dos hospitais psiquiátricos de todo o Brasil, sendo um expoente da chamada luta anti-manicomial. Morreu de complicações geradas por um câncer de fígado. Sabe-se que o escritor aguardava um transplante há mais de um ano. O falecimento deu-se por volta das 17 horas de ontem, dia 27. O corpo chega a Curitiba na manhã de hoje (28) e será sepultado no cemitério Iguaçu, às 17h.


Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Austregésilo Carrano Bueno foi um escritor brasileiro, integrante do Movimento da Luta Antimanicomial. Autor do livro "Canto dos Malditos" onde conta sua experiência nos hospitais psiquiátricos e denuncia os absurdos cometidos diariamente nessas instituições. O livro baseou o premiado filme "Bicho de Sete Cabeças". Morto aos 51 anos, na tarde de 27 de maio 2008.
Nasceu em 1957, em
Curitiba, Paraná. Em 1974, então com 17 anos, era usuário de maconha e outros medicamentos de uso restrito. Quando o pai de Austregésilo encontrou alguns cigarros de maconha no bolso de uma jaqueta do filho, resolveu interná-lo em um hospital psiquiátrico, para tratar de seu vício (embora admitisse que era apenas usuário). Sem ao menos ter sido examinado, em um período de três anos, Austregésilo foi transferido de um hospital a outro, submetido a torturas e eletrochoques (no total de 21 sessões). Isso durou até que, desesperado, ateou fogo em sua própria cela, sendo retirado a tempo. O ato despertou seu pai, que o tirou do manicômio. Desajustado pelos eletrochoques, pela sedação pesada e torturas variadas, ele acabou sofrendo também nas mãos da polícia, que lhe proporcionou doses extras de humilhação e espancamento.
Morreu na tarde de 27 de maio de 2.008, aos 51 anos. Austry estava internado no Hospital das Clínicas, na zona oeste de São Paulo. Ele morreu em razão de uma infecção generalizada resultado de um câncer no fígado.
O autor foi a primeira pessoa no Brasil a mover uma ação indenizatória por erros de diagnóstico, tratamentos torturantes e crimes contra médicos psiquiatras, em 13 de maio de 1998. Porém, foi condenado pelo Tribunal de Justiça do Paraná a pagar a médicos psiquiatras e seus familiares 60 mil reais de indenização por danos morais devido as críticas aos "médicos" contidas em seu livro. Uma segunda ação, agora por parte das famílias dos médicos mencionados em seu livro, conseguiu que "O Canto dos Malditos" fosse retirado de circulação das lojas e livrarias de todo o país.
Foi o representante nacional dos usuários na reforma psiquiátrica do Brasil. Homenageado em 28 de Maio de 2003 pelo Ministério da Saúde e pelo Presidente da República Sr. Luiz Inácio Lula da Silva, por sua Luta e Empenho na Construção da Rede Nacional de Trabalhos Substitutivos aos Hospitais Psiquiátricos no Brasil.

27 de maio de 2008

A Musicista (1929) & Ametista (1946).
Tamara de Lempicka, óleos s/tela.
Imagens: www.mystudios.com & www.goodart.org
Diagnosticado
os alados das ruas noturnas.
Experimentado
outro lábio antes da sua passagem.
Encontros casuais
Transes ofegantes
Uma espécie de sentido orna alguns instantes
Delirantes
Delirantes
De lírios líquidos
Passantes
Em veias salpicantes
Antebraços
Vibrantes
Desconsertantes
Dormente acordante
Desfilas
Ala da saliva derrapante
Só mais um momento
Dentro
Desse instante
Desorientante
Olhos In praticantes

12 de maio de 2008

soul



Bin - Você tem medo?

Bakuna - De que? Você não diz nada com nada.

Bin - Do terrorismo?

Bakuna - De qual terrorismo?

Bin - Como assim, “de qual terrorismo”?

Bakuna - Desses de homens encapados em fios-bomba? Extermínio de presos nessas cadeias imundas? Pit-bulls que dilaceram seres humanos indefesos? Seqüestros, assaltos a mão-armada? É desse terrorismo que você está falando?

Bin - Claro! E de qual haveria de ser, oras?

Bakuna - O terrorismo de não ser, “oras”!

Bin - Como assim?

Bakuna - Quem é você?

Bin - Que pergunta é essa?

Bakuna - Quem é você?

Bin - Eu tenho um nome, endereço fixo, emprego fixo, amigos, previdência social, salário, conta bancária...

Bakuna - E o que tem de você nisso tudo?

Bin - Oras, como assim?

Bakuna - Você existe?

Bin - Dá pra ser mais claro?

Bakuna - Claro. As coisas existem em você. Um beijo virou mercadoria no seu dia-a-dia. A lua é apenas um ornamento que pode ou não caber dentro do seu orçamento. O que você diz ser, é fantasioso. Você só aceita a receita. Seu bolo é padronizado. A sua vida já deixou de ser alquimia faz tempo. E seu tempo, então? Cronologia pura. As suas horas estão desgastadas no chão de concreto e fabricação barata que você pisa. Seus crimes são contra sua própria essência. E você sequer percebe que você nem existe. Te encaparam de um jeito tão belo pros padrões que faz tudo parecer sonho. Um sonho que de onírico só resta a piedade alheia.

Bin - Eu acho que você é louco!

Bakuna - Conclusão prática pra encher os hospícios.

Bin - Você é louco.

Bakuna - Por que você não se mata? Em nome de ser quem você é. Pronto! Um harakiri em nome do seu nome, de seu estilo de vida? Você teria coragem?

Bin - Não tinha pensado nisso...

Bakuna - Eu poderia dissertar sobre os mártires do suicídio. Eles serão eternamente lembrados. O que você acha de entrar pra história como eles? Só te falta isso pra você provar ser quem você é... E então? O que você acha?

Bin - Você me ajudaria?

Bakuna - Taí uma coisa que sei fazer muito bem!

Bin - Você vai descrevendo sobre os mártires enquanto eu vou sumindo.

Bakuna - Podemos começar agora?

Bin - Preciso me preparar.

Bakuna - Pra morrer?

Bin - Não, pra entrar pra história!

Bakuna - Claro!


“Dissoluta dissoluta ingrata”

O homem acusava a moça, simplesmente porque não conseguia enxergar suas próprias fraquezas. Talvez a palavra mais certa não seja “fraquezas”, mas sim algo que seja mais suspenso – ainda não consegui achar a palavra certa – deixemos fraquezas, que neste exato momento pode ser substituída por franqueza. Pode até parecer que muda o sentido daquilo que o homem não conseguia enxergar, mas só parece. De fato ele também era desprovido de franqueza - franqueza com ele próprio – e isso tem sua gravidade. É fácil se suspeitar gravemente de alguém que não reconhece em si mesmo sequer o seu comecinho – quem dirá então... Há que se percorrer um caminho eterno, há que se percorrer um caminho o qual, ao seu final, se vejam coroas de flores e lápides enfeitando a nova morada daquele que alcançou a eternidade no cemitério ou no crematório.