10 de junho de 2008

t-r-a-n-s-e

Pan pan pan pan…

Pan pan pan pan…

Era assim que a música me chacoalhava inteira. Ela me deixava cobra se arrestando. Comprimia meus músculos. E eu, sem perceber, subia e descia paredes.

Entre um trago e outro de vodka, eu absorvia e exalava a energia sexual do último dia da minha vida. Apoiada sobre as ancas eu só conseguia suspirar. Parecia mais um urro de lobo na lua cheia. Um tigre que devorava e desencravava as próprias entranhas.

Uma gaita insistia em meus ouvidos. Uma incontrolável saudade banhava a demência daquele momento. E que saudade!

Um grito de porta quase me fez sair do transe egocêntrico. Os vinis, a essa altura, já estavam sob mim. Fizeram a cama e eu caí. Eu ruí. Os sons daqueles velhos amigos amaciaram a queda quase fatal. Amigos empoeirados.

Pan pan pan pan pan...

Pan pan pan pan pan...

A música insistia em me abandonar ao instinto sensual. Eu bolia com a maciez da vulva. Um líquido transparente deslizava tão devagar como se quisesse fecundar. Eu podia ouvir o seu barulho fértil. Algo em mim tentava vida própria, que ironia! A ironia da inconsciência.

Os vinis continuavam interessados na insensatez que os sucumbia. Curiosos, eles derretiam. A tinta das paredes derretiam. Os livros, em chamas. Os móveis pingavam o meu suor. O chão, receptáculo da loucura toda, se gabava. Os tambores tomaram conta.

O que for, que seja.

Enquanto isso eu fremia louca. Demasiado louca. Não era mais que um carvão em brasa. Os olhos escondiam-se na sua brancura. Os pingüins desfilavam dirigindo-se até mim.

Eu estava sentindo o frescor que eles traziam. Um frescor incrível como as ondas em alto mar. Eram fuzileiros da condenação. Eu ia ser fuzilada e só conseguia sentir o mais incrédulo de todos os prazeres que tive.

As luzes piscavam. Eu, cada vez mais, atordoada. Tonta. Transe pitoresco.

O abraço me atingiu. Senti o corpo trepidar. E ainda viva estive morta. Aquele abraço me abraçou de uma vez, sem sorrisos, sem ser educado ou gentil. Um abraço sem curvas.

Um líquido frio e cortante que flamejava. Fui perdida, esquecida naquele abraço. Desamparei a mim mesma. Decomposta e atestada morta.

Nenhum comentário: